Time de Guedes projeta superávit de ao menos R$ 6 bi em 2022, mas resultado volta ao vermelho no próximo ano

Apesar de projetar um resultado no azul para as contas públicas deste ano, o governo deve encaminhar ao Congresso até o fim do mês uma proposta de Orçamento para 2023 com saldo novamente no vermelho e déficit pouco menor do que os R$ 65 bilhões autorizados pela Lei de Diretrizes Orçamentárias.

A avaliação de membros da equipe econômica ouvidos pela Folha é que os impactos com o Auxílio Brasil, o reajuste do funcionalismoa correção da tabela do Imposto de Renda e os subsídios aos combustíveis são hoje os quatro principais desafios na mesa para fechar as contas do primeiro ano do próximo mandato presidencial.

Num cenário considerado conservador, o time de Guedes vê garantido um superávit de R$ 6 bilhões neste ano para o governo central, o primeiro após oito anos de rombo (e o segundo seguido para o setor público consolidado, que considera também estados e municípios). O quadro de 2022 tornou-se possível com a ajuda de receitas extraordinárias.

Além da recuperação acima do esperado na arrecadação federal (impulsionada pela inflação e pela disparada do preço do petróleo), já entraram na conta deste ano dividendos solicitados pelo governo ao BNDES (R$ 18,9 bilhões) e recursos da privatização da Eletrobras (R$ 26,8 bilhões) —mas ainda há todos os dividendos a serem recolhidos no segundo semestre, inclusive os turbinados por pedido do Executivo.

O governo projeta retorno ao déficit em 2023 mesmo com a indefinição sobre como acomodar os quatro desafios no Orçamento. Ainda que as medidas sejam desconsideradas nas contas, outros fatores pesam nas contas federais, como o natural crescimento das despesas obrigatórias.

Caso essas medidas sejam incluídas na peça orçamentária de alguma forma, ainda dependeriam de alterações legais para serem viabilizadas. Segundo técnicos, é possível incluir na proposta de Orçamento algumas indicações de que os valores podem ser modificados posteriormente.

Em entrevista nesta semana, o presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou que o texto orçamentário trará um “indicativo para manter os R$ 600 [do Auxílio Brasil]”. Atualmente, as regras do programa preveem o pagamento de R$ 600 apenas em 2022 –e, a partir de janeiro, o pagamento cai para R$ 400.

Isso, combinado com a entrada de mais 2,2 milhões de famílias, faz a demanda total de recursos para o programa subir de R$ 89 bilhões em 2022 para R$ 158 bilhões no ano que vem –segundo cálculos usados pelos técnicos.

REAJUSTE A SERVIDORES DEVE AUMENTAR APERTO NOS COFRES PÚBLICOS EM 2023

O reajuste para servidores também deve consumir espaço fiscal. O governo prevê a concessão de um aumento correspondente à inflação projetada para o ano que vem. O mercado estima atualmente um índice de 5,33% para 2023 (o que poderia demandar R$ 16 bilhões para a medida), mas o governo tem calculado um percentual na casa dos 4% (um custo aproximado de R$ 12 bilhões).

Despesas como essas tomam espaço no teto de gastos, o que tem diminuído a margem da manobra para as chamadas despesas discricionárias (as não obrigatórias, onde estão os investimentos). Em 12 meses terminados em junho, a execução das discricionárias foi de R$ 155 bilhões (menos de 10% do total) –e o número deve ser ainda menor em 2023.

Já a eventual atualização da tabela do Imposto de Renda e uma possível continuidade da política de subsídios aos combustíveis em 2023 não consomem espaço do teto de gastos (por serem medidas no lado das receitas), mas afetam o resultado primário.

A atualização da tabela do Imposto de Renda foi prometida nos últimos dias por Bolsonaro para o ano que vem, após ele ter feito o mesmo durante a campanha de 2018.

Apesar disso, o tema ainda não é consenso dentro do governo. Para que o plano vá adiante, é visto como necessário um conjunto de contrapartidas –como, por exemplo, a limitação das deduções com despesas médicas.

O governo também não desistiu da ideia da taxação de dividendos, que pode servir como fonte de receitas para o Auxílio Brasil de R$ 600 a partir do ano que vem (embora o problema não resolva a dor de cabeça do teto).

Enquanto fecha as contas de 2023, o Ministério da Economia demonstra otimismo cada vez maior com as contas de 2022. Ajuda na conta a possibilidade de “empoçamento” de R$ 16 bilhões dos gastos até dezembro. São despesas que, embora liberadas, acabam não sendo efetivadas por questões burocráticas.

Esse fator, somado a um plausível aumento de dividendos após pedido do governo e ganhos extras de arrecadação tributária e previdenciária, pode permitir que o superávit de R$ 6 bilhões seja superado.

Por outro lado, o governo sofre pressões para desbloquear recursos de emendas parlamentares e para gastos dos ministérios. Neste ano, R$ 12,7 bilhões já foram bloqueados. Uma eventual liberação de recursos reduziria o saldo positivo nas contas de 2022.

Apesar do retorno ao déficit no ano que vem, os técnicos do governo avaliam que a trajetória dos últimos anos mostra o país em um gradual reequilíbrio fiscal após a série de resultados negativos desde 2014. Pelas previsões oficiais do Ministério da Economia, um retorno ao resultado positivo depois do azul de 2022 só seria observado em 2025.

 

Via Folha de S. Paulo