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Por Henrique Napoleão Alves

 

Em 2007, uma senhora de idade recebeu uma doação de cem mil reais de seu muito idoso pai. No ano seguinte, preencheu e enviou a Declaração relativa ao Imposto de Renda, informando a doação à Receita Federal. Agiu de boa-fé, seguindo orientações de um contador amigo da família; não sabia que tinha o dever de informar a doação para a Receita Estadual (via Declaração própria) e de recolher o imposto respectivo.

Em 2015, o Fisco Estadual decidiu autuá-la. O valor total da cobrança, próximo a dezoito mil reais, é composto principalmente por juros e penalidades. No auto, afirmou que tomou conhecimento da doação quando, em 2011, acessou as informações respectivas a partir de um convênio de cooperação com a Receita Federal.

O Fisco poderia proceder dessa maneira? Quando começa, e quando termina o prazo para que o Fisco constitua crédito tributário relativo ao imposto sobre doações?

A posição fiscal

O caso descrito acima é imaginado; a realidade possui incontáveis situações semelhantes, envolvendo tanto pessoas físicas quanto pessoas jurídicas.

Na matéria, a posição fiscal costuma ser a de que o prazo decadencial de cinco anos começa no primeiro dia do exercício seguinte (1) àquele em que se deu a apresentação da Declaração estadual pelo contribuinte, ou (2) àquele em que o Fisco teve acesso às informações necessárias à lavratura do ato de lançamento.

A posição do contribuinte

O art. 173, I, do CTN prevê que o direito do Fisco de constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado.

Em sua defesa, o contribuinte pode arvorar-se em pelo menos duas teses principais:

I. O lançamento poderia ter sido efetuado desde a consumação do fato gerador (in casu, o fato imponível se deu em algum momento do ano de 2007). Assim, o prazo iniciou-se no primeiro dia do exercício seguinte (2008), encerrando-se cinco anos depois.

II. A posição em prol do momento em que o Fisco Estadual tem acesso às informações necessárias para o lançamento não está abarcada pela literalidade e pelo telos do art. 173, I, do CTN. Com isso, contraria também a reserva constitucional de lei complementar para a matéria (art. 146, III, “b”). Contudo, mesmo se fosse esse o critério legal, ainda assim a decadência teria ocorrido. O convênio de cooperação já existia quando ocorrido o fato gerador; assim, desde o momento em que a Declaração foi remetida à Receita Federal (in casu, 2008) era possível que o Fisco Estadual tivesse acesso às informações concernentes.

Decisões favoráveis ao critério da consumação

Há várias decisões do STJ em prol do critério da consumação do fato gerador. Nas palavras de uma delas (AgRg no REsp nº 577.899/PR):

“A circunstância de o fato gerador ser ou não do conhecimento da Administração Tributária não foi erigida como marco inicial do prazo decadencial, nos termos do que preceitua o Código Tributário Nacional, não cabendo ao intérprete assim estabelecer.”

Outros acórdãos seguiram o mesmo sentido: AgRg no REsp nº 243.664/RSResp n. 1.252.076/MGAgInt nos Edcl no Resp n. 1.683.388/MGAgInt no AgInt no AREsp 957.872/RJAgInt no AREsp 1.064.022/MGAgInt no Resp n. 1.665.178/MG; etc.

Outra decisão de interesse, do mesmo STJ, cuidou de contribuição previdenciária e submeteu-se ao rito dos Recursos Repetitivos (REsp nº 973.733/SC). Nela, o mesmo parâmetro foi adotado:

“O dies a quo do prazo qüinqüenal […] rege-se pelo disposto no artigo 173, I, do CTN, sendo certo que o “primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte àocorrência do fato imponível.”

A linha interpretativa acima respeita a letra do art. 173, I, do CTN, e também sua finalidade: promover segurança jurídica.

Fonte: Tributário.net.