Objetivo é simplificar a discussão. Unificação do IPI e ‘nova CPMF’ seriam propostos em um segundo momento, diz secretário adjunto

O governo quer acelerar o envio de pontos da sua proposta de reforma tributária considerados menos polêmicos, enquanto costura o apoio a medidas mais difíceis de serem aprovadas, como as que interferem na divisão de recursos com estados e municípios e a criação de uma “nova CPMF”. Segundo o secretário especial adjunto da Receita Federal, Marcelo de Sousa e Silva, o pontapé inicial dessa estratégia será a fusão de PIS e Cofins, dois tributos federais que arrecadam cerca de R$ 300 bilhões por ano.

A unificação seria o primeiro passo para a criação de uma Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que, no futuro, incluiria outros impostos federais.

O esboço do projeto do Executivo foi apresentado nesta terça-feira pelo secretário, em seminário promovido pelo Sindicato dos Auditores Fiscais (Sindifisco). Ele informou que essa primeira parte da proposta deve ser apresentada na semana que vem. Durante a palestra, Silva também confirmou que a alíquota inicial da nova contribuição sobre pagamentos, aos moldes da antiga CPMF, será de 0,4%.

Nas transações via cartão de débito ou crédito, essa cobrança será dividida entre as duas partes da operação — cada lado pagará 0,2%. Nos saques e em depósitos em dinheiro vivo, a alíquota de 0,4% seria cobrada de uma só vez de quem retira ou deposita.

Segundo Silva, a unificação de PIS e Cofins poderia ser feita por projeto de lei, o que facilitaria a aprovação da medida. A ideia é reduzir a burocracia envolvida no pagamento dos dois impostos.

O resultado da fusão seria uma CBS com alíquota de 11%, no sistema não-cumulativo, em que empresas podem compensar o imposto em etapas anteriores da cadeia. Hoje, a soma das alíquotas de PIS e Cofins nesse modelo é de 9,25%.

A proposta do governo acabaria com o sistema cumulativo, em que a alíquota combinada é menor, de 3,65%, mas não há compensações. Este modelo costuma beneficiar setores como o de serviços, que gastam muito com mão de obra — despesa que não gera crédito tributário.

Ficariam para depois, segundo o secretário, a inclusão de mais dois impostos na CBS: o IPI e a Cide, que envolvem a divisão de recursos com estados. Perguntado sobre quando o Executivo enviaria a proposta de uma “nova CPMF”, Silva disse que ficaria para uma “segunda etapa”.

— (A contribuição sobre pagamentos) vai vir numa PEC, junto com o IPI. Numa segunda etapa. A reforma tributária é um conjunto de propostas, não é como a reforma da Previdência, que é pontual. Cada base tributária tem uma lei diferente, uma forma de aprovar diferente — disse o secretário.

Silva acrescentou que o objetivo é testar o modelo defendido pelo governo e “ganhar credibilidade”:

— Se você quer fazer um projeto grande e não faz entregas parciais, muito provavelmente esse projeto não vai manter o apoio. Precisamos fazer entregas para que a gente consiga testar, ajustar, ganhar credibilidade, inclusive com estados e municípios.

Para especialistas, unificar PIS e Cofins faz sentido, já que os dois tributos incidem sobre a mesma base, o faturamento das empresas. Mas a medida não será suficiente para acabar com a burocracia.

— O simples fato de juntar não muda nada. O que eu gostaria de ver é um aprimoramento na legislação — observa Hermano Barbosa, sócio da área de Direito Tributário no BMA-Barbosa Müssnich Aragão.

O tributarista Luiz Gustavo Bichara acrescenta que a medida é “tímida”:

— Seria um passo tímido e desanimador. Vamos acreditar que a Receita vai continuar dando sua contribuição para uma reforma tributária de verdade, participando dos debates no Congresso, em vez de termos só mais um remendo na atual colcha de retalhos.

A proposta do governo chegará ao Legislativo após parlamentares terem tomado a iniciativa na pauta tributária. Hoje, dois textos sobre o assunto tramitam no Congresso: um na Câmara e outro no Senado.

Ambos são mais abrangentes e incluem impostos regionais, como o ICMS e o ISS. Ontem, o relator da proposta da Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), disse que aguarda uma proposta formal do Executivo:

— Toda semana tem uma especulação sobre o que o governo vai fazer. Vamos esperar o que há de concreto.

No Senado, o governo também enfrenta mal-estar. Ontem, durante o seminário dos auditores, o líder do PSL na Casa, Major Olímpio (SP), disse que, se o governo enviar sua proposta pela Câmara, quebrará um acordo feito com senadores, que buscam protagonismo na reforma tributária:

— (Se a proposta vier pela Câmara) vai cair para a gente do mesmo jeito, só que aí o ânimo será outro. Não consegui falar com ele (o ministro da Economia, Paulo Guedes), mas é bom ele se atentar para respeitar o Senado também.

Enquanto isso, já há expectativa de que a reforma seja contestada na Justiça. Esse é o diagnóstico do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux, que participou do mesmo evento.

— A unificação vai gerar uma alíquota única desse imposto sobre bens de consumo. Então, uma alíquota única vai ser aplicada para empresas portentosas e empresas que não têm muito fôlego, e isso desiguala. Isso de alguma maneira fere a capacidade contributiva. À luz dos debates, virá certamente uma judicialização dessa matéria.

Fonte: Época Negócios