Estudo mostra que funções de baixa qualificação no Executivo federal poderiam ser eliminadas com processos modernos

O Executivo federal tem 105 mil servidores alocados em posições com alta probabilidade de automação, segundo estudo que será apresentado no Encontro Nacional de Economia da Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec), em dezembro.

O trabalho considera apenas os servidores civis ativos com jornada igual ou superior a 40 horas semanais em dezembro de 2017. Assim, foram considerados 521,7 mil de um total de 627,3 mil funcionários registrados no Sistema Integrado de Administração de Pessoal (Siape), do governo federal.

O trabalho é do economista Willian Adamczyk, doutorando da PUC-RS, em coautoria com Leonardo Monastério, coordenador-geral de ciências de dados na Escola Nacional de Administração Pública (Enap), e Adelar Fochezatto, professor na pós-graduação em economia da PUC-RS.

As funções mais “automatizáveis” são, em geral as de escolaridade mais baixa e com remuneração abaixo da média de R$ 9.913 mensais do Executivo federal. “Essa tendência está em linha com a conclusão de outras pesquisas que consideram maior impacto da automação sobre profissões de menor qualificação e menor nível salarial”, diz Adamczyk.

Entre os profissionais em ocupações de alta propensão à automação, destacam-se os assistentes administrativos (73 mil servidores), seguidos de longe pelos auxiliares de escritório (8 mil), funções comuns a vários ministérios. Os cerca de 105 mil servidores em posições com alta probabilidade de automação recebiam em 2017 uma massa de salários de R$ 594 milhões por mês, ou 11,5% dos R$ 5,2 bilhões da folha mensal do Executivo Federal.

Há diferentes estudos sobre automação do trabalho, sob diferentes abordagens, mas é a primeira vez que se estima o impacto específico sobre o setor público brasileiro, afirma Adamczyk. O trabalho, que foi apresentado a técnicos no Ministério da Economia, surge num momento oportuno, em que se discute a reforma da administração pública no país. “O estudo pode ajudar o poder público na projeção de demanda de servidores para o futuro, reduzindo custos e elevando produtividade”, diz.

A inovação do trabalho, afirma, é a criação de um algoritmo chamado BOT (de Bartik Occupational Tasks), que identifica as tarefas em que tecnologias de automação podem ser introduzidas. O método evita o uso de classificações subjetivas, como as encontradas em outros estudos sobre o tema, diz o pesquisador.

“Os estudos basicamente perguntam para os especialistas das áreas de automação, inteligência artificial, ‘machine learning’, quais as atividades ou ocupações que eles acreditam que serão automatizadas. Isso é muito subjetivo. Então, aplicamos um método aos dados da realidade brasileira para ver o que está acontecendo e apontar qual será o caminho dessa automação.” O método proposto pelos autores pode ser aplicado ao Executivo de Estados e municípios.

Para chegar aos 105 mil servidores, ou 20% do total dos funcionários que trabalham 40 horas ou mais por semana, o BOT extraiu informações dos textos que descrevem as tarefas das 2.627 ocupações existentes na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), que depois foram cruzadas com dados do Siape e da Relação Anual de Informações Sociais (Rais).

Um dos diferenciais do estudo, segundo Adamczyk, é que ele parte da abordagem da automação de tarefas, em vez de ocupações. A automação com base em ocupações busca encontrar as profissões que tendem a desaparecer nas próximas décadas e o impacto do desemprego tecnológico sobre salários. Uma das críticas a esse método é que ele superestima o potencial de perda de empregos. Um estudo bastante conhecido dos economistas Benedikt Frey e Michael Osborne, da Universidade de Oxford, estimou que cerca de 47% dos empregos dos Estados Unidos possuem elevado risco de desaparecer em três décadas.

Uma adaptação desse estudo feito para o mercado de trabalho brasileiro encontrou um percentual ainda maior, de 54,5%. Já estudos a partir da abordagem que toma a chance de automação com base em tarefas estimaram que na média dos países desenvolvidos apenas 9% dos trabalhadores estavam em ocupações com alto risco de desaparecer. No Brasil, esse percentual seria de 29%, fatia bem maior porque a maior parte da mão de obra está em atividades intensivas em habilidades rotineiras e de baixa escolaridade.

Em que pese existir um grande debate sobre ambos os métodos, o estudo permite concluir que há grande potencial de automação no serviço público brasileiro. Os órgãos do Executivo federal que lideram a probabilidade de automação são o Ministério da Educação, com 18,8% das funções “automatizáveis”, seguido de perto por Saúde e Fazenda, com 17,9% e 17,8%. No Ministério da Justiça, a fatia chega a 13%. O estudo considera o Ministério da Fazenda antes de sua transformação em Economia, que juntou vários outros órgãos da Esplanada em um só.

Fonte: Valor Econômico – Via Fenafisco