Na corrida para alcançar a meta fiscal e garantir a sua credibilidade, o governo federal deve considerar outras medidas pelo lado da receita nos próximos meses, diante do espaço restrito para cortar gastos, avaliam especialistas.

O sócio da 4E Consultoria, Juan Jensen, afirma que o governo até poderia aumentar a permissão de rombo nas suas contas, hoje estabelecido em R$ 139 bilhões, mas que dificilmente ele deve optar por isso, sob o risco de perder a credibilidade interna e externa. “A regra do teto de gasto permite que a União tenha um déficit de até R$ 200 bilhões. Porém, o governo não deve fazer alterações na atual meta, pois o que ele busca é manter a sua credibilidade”, analisa Jensen.

“O governo colocou para ele mesmo o objetivo de não ultrapassar o déficit de R$ 139 bilhões e deve fazer o possível para que isso aconteça, para não gerar um problema de reputação”, acrescenta o sócio da 4E.

O economista Fábio Klein, da Tendências Consultoria, faz uma avaliação semelhante à de Jensen, afirmando que se o governo tiver que optar entre um aumento da meta fiscal ou por uma elevação de tributos, esta última alternativa é a mais provável de acontecer. “O descumprimento da meta fiscal deve ser a última opção do governo”, destaca o economista.

“O governo está tentando ganhar credibilidade e esta credibilidade passa por ele conseguir fazer um ajuste fiscal”, completa Klein.

Na última quarta-feira, os ministros da Fazenda e do Planejamento, Henrique Meirelles e Dyogo Oliveira, anunciaram um contingenciamento de R$ 42,1 bilhões no orçamento deste ano e ações para levantar recursos no valor de R$ 16,1 bilhões. O objetivo federal é de cobrir o “buraco” de R$ 58,2 bilhões que separa a União da sua meta fiscal deficitária de R$ 139 bilhões.

Essas medidas de receita incluem a reoneração da folha de pagamentos para 50 dos 54 setores beneficiados pela política (o que deve gerar R$ 4,8 bilhões ao caixa federal); a venda de quatro usinas hidrelétricas (10,1 bilhões) e um aumento do Imposto sobre as Operações Financeiras (IOF) voltado para as cooperativas de crédito (R$ 1,2 bilhões).

Restrição

Porém, para o economista da Tendências Consultoria, uma nova rodada de elevação de tributos ou de reoneração pode acontecer nos próximos meses frente à dificuldade de diminuir despesas.

“Um corte de R$ 42 bilhões é um desafio enorme para ser cumprido. É muito difícil para o governo fazer uma redução nessa magnitude no orçamento, porque a base contingenciável é bem menor do que ela aparenta, como a própria Fazenda mostrou em relatório”, comenta Klein.

Na manhã da última quarta, a Fazenda divulgou um documento explicando que os gastos contingenciáveis correspondem a R$ 133 bilhões, mas que, cortá-los em sua totalidade neste momento, prejudicaria a oferta de serviços públicos essenciais, como os das áreas de saúde e educação.

“Retirando o PAC [R$ 36,7 bilhões], as despesas contingenciáveis nos ministérios somam R$ 96 bilhões. Ou seja, se for feito um corte de R$ 42 bilhões, você vai reduzir praticamente pela metade os gastos que o governo pode diminuir, o que não é trivial”, diz Klein.

“A nota da Fazenda mostrou que, desses R$ 96 bilhões, quase metade são das áreas de saúde e educação”, completou.

Ontem, a própria secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, avaliou que o corte de R$ 42,1 bilhões no orçamento será um “esforço contundente”. Segundo ela, é preciso que todos os órgãos da administração federal se preparem para o contingenciamento, que tem como objetivo o cumprimento da meta fiscal. “Cumprir a meta fiscal é importante para voltarmos a um cenário de equilíbrio nas contas públicas”, definiu.

Recomposição

Para gerar receitas, Klein acredita que o governo deve optar antes por uma recomposição da carga tributária, por meio de mais medidas de reoneração, do que por um aumento de impostos. Por conta disso, ele afirma que a equipe econômica deve avaliar a agenda de vencimento das desonerações para tomar uma decisão nos próximos meses.

Klein comenta ainda que, no caso de um aumento de imposto, uma das alternativas viáveis é a elevação da Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre os combustíveis. Segundo o economista, além da atual alíquota da Cide estar longe do seu teto, a medida não precisaria tramitar no Congresso.

O professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), Mauro Rochlin, por sua vez, diz que é provável que um aumento de impostos ocorra mais para a metade do segundo trimestre, “período em que é esperado alguma reação nos indicadores econômicos”. “É melhor anunciar alta de tributos em um momento em que a economia já esteja em recuperação”, afirma Rochlin.

Ontem, Meirelles chegou a reafirmar que a prioridade do governo é a restauração do equilíbrio fiscal e o cumprimento da meta em 2017 e avaliou que as desonerações dadas nos últimos anos não levaram à recuperação e ao crescimento da economia. “Muito pelo contrário, a economia entrou em recessão muito séria, inclusive por incertezas de ordem fiscal. Portanto, a prioridade absoluta agora é restauração do equilíbrio fiscal e cumprir a meta estabelecida de resultado primário para 2017”, disse ele.

Fiscal ruim

Ontem, dados da Secretaria do Tesouro Nacional mostraram que o resultado primário do governo central (INSS, Banco Central e Tesouro Nacional) continua apresentando forte queda nas receitas e corte de despesas. Segundo o Tesouro, a União ficou deficitária em R$ 7,222 bilhões no primeiro bimestre de 2017, resultado da retração real de 6,6% na sua receita líquida, para R$ 187 bilhões, e diminuição de 7,9% nos seus gastos, para R$ 195 bilhões. As variações são com relação ao primeiro bimestre do ano passado.

 

Via DCI