Os números negativos registrados em agosto devem promover uma revisão nas projeções dos analistas referentes ao acumulado de julho a setembro, o que afetaria a expectativa para o ano

A queda generalizada nos setores econômicos e indicadores da atividade referentes a agosto surpreenderam especialistas. Eles devem revisar as projeções para baixo com relação ao terceiro trimestre, de modo que o resultado de 2016 dependerá deste final de ano.

De acordo com Rafael Bacciotti, analista da Tendências Consultoria, os números negativos de agosto – com pesquisas divulgadas nesta semana – e a estabilidade da atividade percebida em setembro promovem um terceiro trimestre ainda mais negativo, cuja expectativa da empresa para o Produto Interno Bruto (PIB) deverá ser revista dos atuais -0,2% para uma queda “próxima de 1%”.

“Para o quarto trimestre, a expectativa estava em leve alta de 0,3%, mas ainda é preciso enxergar como os setores vão se encaixar”, avalia.

Baciotti destaca que é “difícil ver uma recuperação chegar” nos últimos três meses do ano. “Podemos esperar uma acomodação, mas os dados do mercado de trabalho e de crédito continuam muito ruins, o que compromete a velocidade da reversão e até o retorno em si”, completa.

Ontem, o Banco Central (BC) divulgou que o Indicador de Atividade Econômica da instituição, o IBC-Br, de agosto, ficou em 132,78 pontos no índice dessazonalizado (sem efeitos sazonais), o que representa uma queda de 0,91% na comparação com julho e um recuo de 4,43% em relação a igual mês do ano passado. No acumulado de 12 meses até agosto, a redução é de 5,6%.

“A mensagem é que ainda piora antes de melhorar e a abertura desse índice é preocupante. Com os três principais componentes do PIB negativos, fica difícil consolidar a melhora que, até agora, só é sentida nas expectativas”, identifica Patrícia Pereira, gestora de renda fixa da Mongeral Aegon Investimentos.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os três principais componentes do PIB vieram negativos em agosto, com o maior destaque para produção industrial (-3,8%). Em seguida, veio Serviços (-1,6%) e comércio varejista (-0,6%).

Já em relação ao Monitor do PIB, também divulgado ontem, pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), o pesquisador responsável, Claudio Considera, diz que mesmo “em velocidade e resultados mais baixos do que o esperado, a direção dos números é correta”.

“O consumo das famílias, por exemplo, ainda está negativo, mas já está maior do que o observado em janeiro deste ano e isso acontece, gradativamente, para todos os índices”, comenta o pesquisador.

Na variação geral, o Monitor do PIB recuou 0,35% no trimestre móvel finalizado em agosto na comparação com os três meses anteriores e 1,61% em relação ao mês de julho.

Já em relação ao consumo das famílias, a queda foi de 3,4% em agosto ante julho e de 4,4% na mesma relação entre trimestres móveis. No período de três meses finalizado em dezembro do ano passado, a retração era de 6,8%.

“A confiança das famílias e dos empresários estão crescendo porque, com as novas medidas de ajustes fiscais, a população passa a acreditar na melhora futura. O problema é que essa retomada não se fez presente”, afirma Considera.

‘Fraqueza’

Além disso, o IBGE também aponta uma taxa de desocupação em 11,8% no trimestre móvel encerrado em agosto, aumento de 0,6 ponto percentual (p.p.) em relação ao período entre os meses de março e maio deste ano (11,2%).

“O que vemos no cenário de hoje é que todos os componentes da economia padecem da fraqueza do mercado de trabalho. Ele é o último indicador a piorar na crise, mas também é o último a melhorar na recuperação”, complementa Patrícia Pereira.

Os especialistas ouvidos pelo DCI ainda destacam que os resultados estão “muito conectados” e que, antes mesmo dos resultados negativos de renda e emprego – que impactam diretamente os setores de serviços e varejo – o apetite para investimentos já caía e ainda demorará a se recuperar.

“Toda a economia está em uma expectativa positiva, mas aguarda que os ajustes aconteçam de fato. O problema é que os empresários não vão voltar a investir pesadamente antes de uma mudança fiscal e de uma redução considerável nas taxas de juros”, analisa Considera, do Ibre/FGV.

Ele ainda opina que o Banco Central espera a aprovação do ajuste fiscal para uma “redução mais intensa na Selic”.

“Poderemos enxergar um ciclo virtuoso na economia a partir dos reajustes, mas muitas outras reformas de caráter microeconômico precisarão melhorar para os empresários sentirem os reais efeitos”, completa o pesquisador.

De acordo com Bacciotti da Tendências Consultoria, mesmo com o baixo crescimento de 1,5% projetado para 2017, “ainda estamos muito longe de converter a queda acumulada”.

“Podemos e vamos crescer em um ritmo muito fraco exatamente pelas questões de emprego, renda e investimentos que estamos vendo hoje”, diz.

O analista ressalta que o ano que vem, pelo menos até o final do primeiro semestre, ainda carregará as impressões negativas apresentadas em 2016.

“Sairemos da crise com pessoas e empresas bastante endividadas e muita coisa a se trabalhar”, explica Bacciotti.

Apesar da melhora na taxa negativa de investimento (de -19,1% no trimestre móvel terminado em dezembro de 2015 e em relação a igual período de 2014; para 7,9% no trimestre até agosto na mesma base de comparação) e na perspectiva de números positivos para o ano que vem, no entanto, a volta a antigos patamares “está longe de acontecer”.

“A economia ainda está reagindo a todas as escolhas erradas feitas nos anos anteriores. A melhora de 2017 somente vem por efeito de comparação com este ano, que foi muito depreciado”, argumentou a gestora Patrícia Pereira.

 

Via DCI