Nessa semana, uma decisão do Tribunal de Contas de Santa Catarina desanimou aqueles que defendem limites no gasto público, em especial na folha pagamento. O TCE/SC considerou regular o cálculo do Ministério Público do Estado que retira da despesa o imposto de renda retido dos servidores, considerando gasto apenas o valor líquido da folha. O assunto já foi abordado por esse colunista em março, quando o MP efetuou, unilateralmente, a alteração, e, depois de fazê-la, protocolou consulta ao TCE/SC para saber se podia fazer o que, na prática já tinha feito.

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) surgiu em 2000 como um dos pilares da estabilidade econômica almejada pelo Plano Real. Alcançada a sua “maioridade” este ano, certamente obteve avanços, mas a situação financeira dos Estados e municípios mostra que seus resultados estão muito aquém do almejado.

O desvirtuamento da despesa com pessoal, talvez o principal limite da lei, é um exemplo claro das falhas na sua aplicação. A decisão do TCE/SC não ajudou. Na consulta, decidida em setembro, a tese do MP/SC até teve maioria, mas não suficiente para se tornar regra, e permaneceu valendo uma decisão anterior, o prejulgado 1606 de 2005, pelo qual a mudança de critério só seria possível se efetuada por todos os poderes.

Porém, nessa semana, em outro processo, ao considerar regular a publicação do MP/SC, o mesmo TCE/SC aceitou o cálculo que contraria a própria decisão de 2005, permitindo que o MP/SC adote critério diferente dos demais poderes. O relator do processo, conselheiro substituto Gerson Sicca, foi contra a alteração e votou por determinar ao MP a republicação de sua despesa. Mas prevaleceu um voto divergente, do Conselheiro Zé Nei Ascari, com o desempate do presidente Dado Cherem em seu favor, concordando com a publicação que contraria a regra estabelecida pelo próprio Tribunal em 2005.

O voto vencedor cita outros Estados que já retiram o IRRF do cálculo, dentre eles o Rio Grande do Sul e o Rio Grande do Norte, o que preocupa mais ainda, dada a situação de calamidade nas contas públicas e colapso em alguns serviços apresentados por estes Estados.

 

Decisão contraria LRF

Especialistas no assunto são categóricos ao afirmar que a retirada do IRRF contraria a LRF, além de não ser possível os poderes, MP e TCE adotarem critérios diferentes porque simplesmente a conta não fecha. Pior, pode criar uma folga “fictícia” no limite, permitindo o aumento sem a existência do dinheiro para custeá-lo, ou livrar gestores das consequências legais, inclusive penais, pelo descumprimento da lei.

Outra preocupação alarmante é que o entendimento pode refletir nas contas dos 295 municípios, que poderão fazer o mesmo, criando uma folga fictícia para aumento de gastos e, também, escapando das punições previstas na lei. E, ainda, o fato de a Secretaria do Tesouro Nacional não aceitar a engenharia contábil, podendo bloquear a obtenção de recursos por parte do Estado. Recentemente, boletim publicado pela STN/MF discordou dos números de SC e outros vários Estados, nos colocando dentre aqueles que extrapolaram a Lei.

 

Desvio político

O assunto deve ser uma grande dor de cabeça para o novo Governo que iniciará em janeiro, com promessa de atuação eminentemente técnica. É um problema muito sério, pois o que está em risco é a sustentabilidade financeira do Estado e dos municípios e a sua capacidade de prestar os devidos serviços à sociedade que os mantém.

O Ministério Público é um órgão em defesa da sociedade, tem relevantes serviços prestados. Promotores de justiça atuam de forma exemplar no combate ao crime organizado, sonegação fiscal, crimes ambientais e violência contra a mulher, só para citar alguns exemplos. Da mesma forma o TCE, que possui um corpo técnico altamente qualificado, com relevantes trabalhos no controle e fiscalização da Coisa Pública.

A LRF estabeleceu limites, mas o poder político tratou de desvirtuá-los das mais diversas formas. E, quando as próprias instituições que devem fiscalizar e controlar a aplicação da lei não o fazem com a rigidez necessária, perde-se o discurso.      

 Via NSCTotal – Coluna Moacir Pereira – Por Renato Igor