O risco real de paralisação completa da máquina pública por falta de recursos (o chamado shut down) levou o governo a começar a discutir uma revisão da meta fiscal de 2017, de déficit primário de R$ 139 bilhões. A medida, no entanto, é polêmica. Ela conta com o apoio da ala política, mas não do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, para quem um aumento do rombo nas contas públicas agora seria um golpe na credibilidade da política econômica.

Os interlocutores da Fazenda destacam que, embora tenha feito avanços importantes na área fiscal ao fixar um teto para os gastos públicos, o governo não conseguiu aprovar a agenda mais crucial — a reforma da Previdência — e portanto não teria condições de arcar com os custos de alterar a meta, algo que lembra os tempos do PT, num momento de fragilidade política do próprio presidente Michel Temer (PMDB).

Segundo interlocutores próximos a Meirelles, a própria permanência do ministro no cargo poderia ficar condicionada à preservação da meta (déficit de R$ 139 bilhões).

“Se a reforma da Previdência já tivesse sido aprovada, a conversa poderia até ser outra. Mas sem a reforma, que está cada vez mais distante, mexer na meta é muito ruim”, disse um interlocutor do governo, lembrando que o compromisso fiscal é uma bandeira de Meirelles.

Mesmo assim, um assessor do Planalto disse que o governo pretende concentrar esforços para trazer a reforma da Previdência à pauta do Congresso e, se possível, aprovar uma proposta, ainda que mais enxuta, na Câmara dos Deputados, em agosto.

Depois de elevar impostos para fechar as contas, o governo quer sinalizar à sociedade que também está preocupado em cortar despesas para equilibrar suas finanças e não apenas repassar o custo para os cidadãos.

A postura de Meirelles, contudo, esbarra numa realidade dura, e a mudança da meta pode ser uma questão de tempo. A ala política tem alertado para o fato de que a escassez de recursos públicos para serviços importantes está se tornando um problema cada vez maior.

Já houve problemas na emissão de passaportes e agora há falhas no funcionamento de agências do INSS e na emissão de carteiras de trabalho. Além disso, os investimentos públicos caminham para o pior patamar em 15 anos.

Na próxima semana a equipe econômica deve ampliar o corte de despesas de 2017 para quase R$ 45 bilhões. Além de cortar gastos, houve aumento do PIS/Cofins dos combustíveis — o que deve render R$ 10,4 bilhões aos cofres públicos neste ano.

Mas nada disso será suficiente para fechar as contas, admitem os técnicos. A Fazenda tem agora receitas de concessões e permissões para conseguir atingir o objetivo fiscal de 2017. O total esperado com essas receitas para o ano — especialmente nas áreas de petróleo e energia — é de R$ 25,68 bilhões.

O último relatório bimestral de avaliação de receitas e despesas destaca que a maior parte desses recursos está prevista para ingressar nos cofres públicos em setembro, mas há um alerta: “Caso haja desvio da projeção, o governo tomará as medidas tempestivas de forma a mitigar os riscos fiscais envolvidos”.

Também é essencial para as contas da Fazenda o ingresso de recursos decorrentes da venda da Lotex (raspadinha da Caixa). O modelo de transferência desse ativo para o setor privado começou a ser rediscutido para ser acelerado e poderia render até R$ 4 bilhões. Isso já ajudaria as contas públicas antes da conclusão do processo de concessões.

Somente se essas receitas não se confirmarem, e a arrecadação não reaja mais rapidamente, o ministro poderia ser obrigado a rever sua posição. O relatório bimestral mostrou uma frustração de R$ 34,5 bilhões nas receitas. De acordo com o documento, apenas a desaceleração da economia provocou uma perda de R$ 11,9 bilhões.

A equipe econômica também não conseguiu o que esperava com a segunda etapa do programa de repatriação (que permite a regularização de ativos mantidos no exterior). Assim, o total estimado para o ano com essa medida foi reduzido em R$ 9,8 bilhões.

Os técnicos também reviram para baixo o que vão arrecadar com venda de ativos (-R$ 3,2 bilhões), concessões (-R$ 2,3 bilhões) e dividendos (-R$ 2,9 bilhões).

O programa de reoneração da folha de pagamento das empresas foi alterado pelo Congresso e provocou uma perda de R$ 3,9 bilhões em 2017. Por outro lado, o governo incluiu na conta do ano R$ 10,2 bilhões em precatórios, R$ 5,8 bilhões acima do que já estava previsto (R$ 8 bilhões) com o novo Refis.

Mesmo assim, o rombo é tão grande que os técnicos da Fazenda informaram que será preciso contingenciar R$ 5,9 bilhões. Com mais essa tesourada, o total em despesas congeladas pelo governo no ano subirá para quase R$ 45 bilhões.

O ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, adiantou que o governo quer fazer um corte inferior R$ 5,9 bilhões no Orçamento de 2017. Para isso, a equipe econômica tentará, nos próximos dias, liberar receitas que não puderam ser incluídas nas contas fiscais por pendências operacionais: por exemplo, R$ 2,1 bilhões em precatórios que a Caixa precisa verificar e R$ 2,26 bilhões em outorgas de aeroportos que ainda não terminaram de ser avaliadas pela Anac.

Segundo Oliveira, caso isso seja resolvido até o dia 30, quando o governo precisa publicar o decreto de contingenciamento, o corte de despesas será menor.

O Planejamento também quer liberar outros recursos do Orçamento que estão congelados, mas precisa de uma recuperação das receitas. Isso, contudo, não será tarefa fácil.

O novo Refis, por exemplo, foi feito por meio de uma medida provisória (MP) que foi modificada pelo Congresso. Caso não volte ao formato original, o governo pode acabar vetando o texto e cortando mais em vez de liberar gastos.

 

Via Valor Econômico