Por Renato Lacerda, diretor-presidente da SC Participações e Parcerias
Quando Atenas, por volta do ano 166 AC, decidiu transformar a ilha de Delos em uma zona livre de impostos, para promover o comércio e estimular a economia local, talvez tenha sido ali instituída a primeira Zona Franca da história da humanidade.
Como uma zona franca, Delos oferecia vantagens comerciais significativas, incluindo isenção de impostos e tarifas para mercadorias e navios que passavam por lá, atraindo comerciantes de várias partes do Mediterrâneo, contribuindo para a prosperidade econômica da ilha e estabelecendo-a como um importante centro comercial da época.
No Brasil, mais de 2000 anos depois, a criação da Zona Franca de Manaus pelo governo militar foi parte de um esforço para promover o desenvolvimento econômico na região da Amazônia e reduzir as disparidades regionais no país, oferecendo uma série de incentivos fiscais e tarifários para empresas que se estabelecessem na região.
Da mesma forma, a Constituição Federal de 1988 passou a prever as Zonas de Processamento de Exportação (ZPE) no Brasil como caminho para impulsionar as exportações e atrair investimentos estrangeiros para determinadas regiões do país. As primeiras ZPEs efetivamente só implementadas no Brasil, em 1992, quando foi promulgado primeiro marco legal regulamentando o tema.
Santa Catarina foi contemplada nesta primeira leva com a criação da ZPE de Imbituba, em 28 de abril de 1994, pelo Decreto nº 1.122 do Presidente da República.
Infelizmente, a ZPE de Imbituba está comemorando, neste mês de abril, 30 anos de inexistência. Mas esta frustrante realidade não é exclusiva de Santa Catarina: diversos fatores impediram o crescimento e o desenvolvimento das ZPE no país, entre eles as dificuldades com infraestruturas remotas e inadequadas, burocracia e falta de incentivos, falta de integração com cadeias de valor globais, queixas das indústrias instaladas fora de ZPE, contra a concorrência desleal, além de diversas outras questões de instabilidade econômica e política.
Porém, em 2021, uma nova regulamentação mudou o setor, com inovações legislativas que tornaram o assunto novamente atrativo, seguindo uma tendência mundial e buscando simplificar procedimentos, reduzir burocracia e melhorar o ambiente de negócios para empresas que operam nessas zonas.
Esta modernização passa a permitir que as ZPEs possam se tornar uma realidade no país, passando a abranger uma ampla gama de setores e atividades, impulsionadas pelo avanço da tecnologia, mudanças nas cadeias de suprimentos globais e demandas do mercado.
O exemplo a ser seguido é o da maior zona franca do mundo hoje em dia, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, recentemente visitada pelo Governador Jorginho Mello. É uma das mais antigas e bem estabelecidas zonas francas do mundo, fundada em 1985, com mais de 10.000 empresas instaladas, abrangendo uma gigantesca área que inclui o Aeroporto Internacional de Dubai, o Porto de Jebel Ali e várias zonas de livre comércio em todo o emirado.
A possibilidade de concessão da ZPE de Imbituba para um operador privado desponta como uma grande oportunidade de negócio que beneficiará todo o Estado e, particularmente, a região do entorno do Porto de Imbituba.
A WFZO, associação mundial que representa as zonas econômicas especiais, aponta exemplos de atividades que uma ZPE do futuro pode desempenhar:
Data Centers – uma ZPE pode se tornar um centro de processamento de dados, pela possibilidade de redução de seus custos. A Zona Franca de Bogotá, com mais de 400 empresas e 30.000 empregos diretos, já possui diversos Data Centers e se destaca pela evolução neste setor. El Salvador também inseriu Data Centers e Parques tecnológicos nas suas Zonas Francas e vem recebendo investimentos significativos nessa área;
Tecnologia e inovação: formação de “Zonas Digitais”, para pesquisa e desenvolvimento, impulsionando a inovação em áreas como inteligência artificial, biotecnologia, tecnologia blockchain, robótica e internet das coisas (IoT);
Comércio eletrônico e logística: com o crescimento contínuo do comércio eletrônico global, pode se especializar em armazenamento, distribuição e logística de produtos, facilitando o comércio transfronteiriço;
Energias renováveis e sustentabilidade: ZPEs podem se concentrar em atrair empresas e investimentos na área de energias renováveis, como solar, eólica e outras formas de energia limpa, além de promover práticas comerciais sustentáveis;
Indústria criativa e entretenimento: Com o aumento da demanda por conteúdo digital e experiências de entretenimento, uma ZPE pode se tornar hub para empresas de mídia, produção de filmes, videogames, música e artes digitais;
Saúde e bem-estar: com o envelhecimento da população global e a crescente preocupação com a saúde, zonas francas podem abrigar empresas de biotecnologia, farmacêutica, dispositivos médicos e wellness, além de serviços de saúde digitais;
Educação e treinamento: uma ZPE pode abrigar centros de excelência em educação e treinamento, oferecendo programas especializados, cursos online e oportunidades de desenvolvimento profissional em diversos campos;
Agricultura e alimentos: as ZPEs podem se especializar em agricultura de alta tecnologia, aquicultura, processamento de alimentos e logística para atender à crescente demanda por alimentos seguros e sustentáveis;
Veículos Elétricos – as Zonas Francas e ZPEs podem ser essenciais para reduzir o custo de veículos elétricos e híbridos, suas partes e peças, baterias etc, com potencial para instalações de pesquisa e desenvolvimento, laboratórios de teste, estações de recarga e infraestrutura de fabricação avançada.
O Estado de Santa Catarina publicou edital (www.ppi.sc.gov.br) para chamamento de estudos para formatação da concessão da ZPE de Imbituba.
Espera-se que os estudos apontem as mais modernas áreas de negócios que podem se destacar nas zonas francas do futuro, para que, finalmente, a ZPE de Imbituba saia do papel.