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Chama a atenção a alta acima de 50% nas importações de eletrodomésticos da China por Santa Catarina

Considerada a fábrica do mundo, a China tem registrado menor crescimento econômico nos últimos anos e, para enfrentar isso, vem aumentando as exportações com preços baixos. Esse movimento vem preocupando a maioria dos países, incluindo o Brasil e setores empresariais de Santa Catarina porque o Estado tem no gigante asiático o maior parceiro comercial de importações. Esse avanço de produtos chineses está motivando uma série de medidas protecionistas, inclusive do governo brasileiro.

O economista-chefe da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), Pablo Bittencourt, destaca que esse cenário registrado pela China ocorre em função da estratégia de crescimento do país asiático, focado nas exportações e que agora tem uma realidade mais difícil, com menor crescimento. Mas somente medidas protecionistas não vão resolver esse desafio no Brasil. É preciso mais competitividade, alerta ele.  

Levantamento junto à Secretaria de Comércio Exterior do Ministério de Desenvolvimento feito pela economista Camila Oliveira, do Observatório Fiesc, mostra um gradativo aumento de importações chinesas, sendo parte delas de alguns setores mais sensíveis para indústrias catarinenses e brasileiras.

Conforme a economista, o crescimento médio anual da participação chinesa na pauta importadora catarinense ficou próximo dos 30% ao ano nos últimos 26 anos. Quando a série histórica foi iniciada em 1997 o país não chegava a 1% de participação nas importações do estado, em 2023 essa participação chegou nos 40,7%, muito distante do segundo maior parceiro comercial pela ótica das importações, o Chile, que tem só 6,2%.

Importações via Santa Catarina

Em 2023, Santa Catarina importou US$ 28,8 bilhões. Desse montante, US$ 11,722 foram compras da China, 1,99% mais do que os US$ 11,492 bilhões de 2022. Entre os produtos mais importantes na pauta de importações de SC vindos da China estão revestimentos de ferros laminados planos e semicondutores.

Mas um dos maiores saltos no total de compras ocorreu no segmento de eletrodomésticos para cozinha, que apresentaram aumento de 56,9% em 2023, comparativamente a 2022, observou Camila Oliveira.

Segundo ela, algumas das grandes fabricantes de eletrodomésticos brasileiras importaram seus produtos da China em 2023. Outro fator foi a entrada de gigantes chinesas no mercado brasileiro de linha branca no ano passado, contribuindo possivelmente para o crescimento nas importações desse tipo de bem.

A pauta de importações catarinenses também tem como produtos de destaques fios e filamentos sintéticos ao setor têxtil e transformadores elétricos. São itens sensíveis para o Estado porque tem produção local de itens semelhantes ou substitutos.

De acordo com Pablo Bittencourt, as maiores queixas em Santa Catarina vêm do setor têxtil e de vestuário. Principalmente pelos preços baixos praticados pelas plataformas que vendem pela internet moda com preços baixos, normalmente, qualidade inferior à de Santa Catarina.  

Setores cobram proteção

Para enfrentar essa concorrência, setores econômicos estão cobrando do governo medidas. Entre os que sentem mais está o setor siderúrgico, que tem presença em SC.

Segundo apuração do jornal Financial Times, o governo brasileiro, nos últimos meses, abriu pelo menos seis investigações para apurar dumping, que é a prática de preços abaixo do custo de produção.

Para o economista Pablo Bittencourt, essa guerra comercial no cenário global poderia recuar um pouco no curto ou médio prazo se o governo chinês estimulasse maior consumo interno e também se a economia da Europa melhorasse e voltasse a comprar mais da China. Mas a primeira hipótese é difícil porque os chineses são, tradicionalmente, poupadores.  

Trajetória da economia chinesa

Conforme Pablo Bittencourt, economias como as da Alemanha, Japão e Coreia do Sul cresceram com exportações gerando déficits comerciais para os Estados Unidos. A China fez isso também depois, a partir da década de 1990 e acelerou a partir dos anos 2000, quando foi aceita pelos EUA na Organização Mundial do Comércio (OMC).

– Aquilo gerou um grande impulso. Foi aquela super onda. Todos os produtores indo para China e a China se tornou a fábrica do mundo. Esse é o contexto histórico. O crescimento das exportações da China foi sempre maior do que o crescimento da sua economia. Isso significa crescimento puxado pelas exportações – explica o economista.

Depois, por volta de 2013 e 2014, o crescimento do país passou a ser mais guiado por investimentos internos, tanto na formação de novas fábricas, quanto na construção civil residencial e não residencial. Esse modelo se esgotou, tanto que surgiram as crises das construtoras, uma das quais a Evergrande.

– Em 2019, o presidente dos EUSA, Donald Trump, observou que a China havia crescido bastante e vinha avançando em segmentos em que a disputa tecnológica é muito intensa, muito decisiva sobre o futuro. Os países que dominam determinadas tecnologias vão dominar o crescimento no futuro e a China estava começando a dominar tecnologias sensíveis ao desenvolvimento da economia dos Estados Unidos e também da economia do resto do Ocidente. Aí Trump coloca um conjunto de restrições ao comércio da China aos EUA e aí inicia a restrição do crescimento chinês com exportações – explica Pablo.

Segundo ele, a Covid acelerou isso porque deixou evidente que alguns países não conseguiam produzir o que é necessário para a vida das pessoas porque toda produção estava concentrada na China. Essas ondas foram limitando a capacidade de crescimento chinês e de outros países.  

Hoje, a China, ao invés de crescer 8% a 9% ao ano está crescendo a 5% ao ano. Pablo Bittencourt observa que o Brasil adoraria estar crescendo a uma taxa de 5%, mas os chineses acham ruim. Segundo ele, o mundo esperava que a China começasse a crescer pelo mercado interno, mas isso não aconteceu.

No ano passado, a China deixou de ser o principal fornecedor dos EUA, lugar que foi ocupado pelo México. No Canadá, os EUA se tornaram o maior fornecedor no lugar da China.

Conforme Pablo Bittencourt, para enfrentar isso, os chineses estão reduzindo os preços dos seus produtos industriais. Os índices de preços desses produtos estão caindo no mundo todo. Outra medida dos chineses está sendo buscar novos mercados no exterior, incluindo mais países da Ásia, Rússia e região, África e América Latina.

Como enfrentar esse cenário

Na avaliação do economista-chefe da Fiesc, a melhor forma que a indústria brasileira tem para enfrentar essa concorrência é se tornando mais competitiva, mais inovadora. Mas além do desafio de inovar, enfrenta obstáculos como a falta de infraestrutura e a elevada carga tributária.

No caso dos impostos, a carga ao setor só vai mudar gradativamente, em 10 anos, com a entrada em vigor totalmente da reforma tributária.  

Como as disputas comerciais continuam e muitas são pontuais, a tendência é o Brasil seguir os outros países e também adotar medidas restritivas específicas para setores, como taxas elevadas para importar.

O governo do presidente Lula está atento a isso. Além de medidas pontuais, no início do ano ele trouxe de volta a tributação para importação de carros elétricos, para que a produção se concentre no Brasil. O resultado apareceu com o anúncio de mais de R$ 100 bilhões por parte das montadoras, que indicaram ênfase a carros híbridos, destacou o economista.

Ao mesmo tempo em que Brasil tenta adotar barreiras para proteger o setor produtivo local, enfrenta restrições no caminho contrário, com a imposição de barreiras comerciais, por parte do país asiático.

Essas medidas restringem ou limitam o comércio, sendo que a China é o segundo mercado que mais impõe barreiras à importação de produtos brasileiros. Fica atrás apenas do mercado europeu, observa Camila Oliveira.

SC tem mercado dinâmio para importações

Nem todas cargas que entram por um dos cinco portos catarinenses tem como destino o mercado do Estado. Mesmo assim, as importações chinesas são grandes porque são compostas por muitos insumos industriais usados por empresas locais. O Estado oferece incentivos para importações.

Entre as empresas que tem crescido com maior fluxo de importações está a Tek Trade, de Itajaí. Nos últimos três anos, o faturamento dela mais do que dobrou com as compras de fora. Passou de R$ 32 milhões para R$ 102 milhões, revela o sócio-fundador, Sandro Marin.

-Santa Catarina possui uma localização geográfica privilegiada no Sul do Brasil e oferece diversas vantagens competitivas para o comércio internacional. Além da proximidade com países do Mercosul, a região se desenvolveu para oferecer condições ideais para armazenagem e distribuição de produtos, inclusive pela BR 101 duplicada. Possui eficientes portos e aeroportos, além de abrigar grandes indústrias que buscam os melhores equipamentos no exterior para gerar bens que atendem todo país e o mundo – avalia Sandro Marin.

Via NSCTotal – Coluna Estela Benetti